Reportagem: Maria Fernanda Souza-EM TEMPO
Um grupo de aproximadamente 50 mototaxistas cercou o prédio do 13º Distrito Integrado de Polícia (DIP), localizado no bairro Cidade de Deus, Zona Leste, na manhã de ontem. No dia anterior, dois homens haviam sido ‘presos’ pela categoria, suspeitos de roubar motocicletas, e levados àquela delegacia.
Diferente do que ocorreu há quinze dias atrás — quando mototaxistas foram apontados como responsáveis pela morte e espancamento de dois suspeitos de assalto —, o grupo chamou a Polícia Militar (PM) para prender os dois acusados, identificados como Wallace Cássio de Souza e Erik Garcez da Costa. “Você pode ver: não tocamos nele, não há um arranhão sequer. Só queremos que a justiça seja feita, apenas isso”, disse o presidente do Movimento dos Mototaxistas do Amazonas, Ozair Santos.
Ao menos 12 pessoas, entre vítimas e testemunhas, estiveram na delegacia para reconhecer os suspeitos. No entanto, o delegado titular do 13º DIP, Einstein Rebouças, alegou que não houve flagrante, já que a dupla não foi presa com motocicletas ou componentes dos veículos roubados. “Não há indícios contra eles. Vou ouvir as vítimas, em seguida os suspeitos, e liberá-los em seguida”, afirmou. Os mototaxistas informaram aos policiais de que, caso os suspeitos fossem liberados, agiriam “com as próprias mãos”. “Pode até não ser na saída imediata, mas vamos até o fim. Se a polícia não faz nada, nós faremos”, disse um deles.
Roubo desenfreado
De acordo com Ozair, assaltos a mototaxistas têm ocorrido com freqüência, em vários bairros da cidade, em especial na Zona Leste. “De janeiro para cá, calculamos que em média 50 mototaxistas foram roubados. O que mais nos revolta é que as motocicletas são financiadas. São pais de família, que precisam trabalhar muito para comprar a moto”, comentou. Os dois suspeitos teriam roubado o veículo do mototaxista Edílson Gonçalves Dácio, 28, no último dia 1º de maio. O assaltou ocorreu no bairro Tancredo Neves, Zona Leste. “Eles estavam armados e me abordaram. Eu estava esperando a minha esposa, quando eles chegaram. Olhei para trás e eles correram para cima de mim”, relatou.
Por volta das 11h30 da última segunda-feira, dia 5, a vítima teria reconhecido os assaltantes em uma rua do bairro Amazonino Mendes, Zona Norte. “Eles não me viram porque eu estava de capacete, mas os dois estavam caminhando juntos na rua. Chamei dois policiais que estavam ali por perto e relatei a situação. Eles prenderam a dupla e trouxeram para o 13º DIP. Em pouco tempo, apareceram várias vítimas, que reconheceram os dois também”, contou Edílson.
Quadrilha especializada
O mototaxista Arinésio Pavão de Albuquerque, 45, compareceu à delegacia com um boletim de ocorrência, feito na Delegacia Especializada em Roubos e Furtos de Veículos (Derfv). A motocicleta dele, uma Titan CG 150, de cor preta e placas JXB-7475, havia sido roubada no dia 4 de abril.
De acordo com ele, os assaltantes agem sempre da mesma forma, passando-se por clientes. “O assalto aconteceu na Cidade de Deus (Zona Leste). Eu estava trabalhando, quando um homem pediu carona. Ao chegar no local, um outro já esperava. Os dois me abordaram com facas e roubaram a minha moto. O pior é que ainda estou pagando o veículo. Ainda faltam quatro prestações”, salientou. Ele entrou na sala de reconhecimento do distrito e não teve dúvidas. “São eles, com certeza”. Assim como Arinésio, outras dez pessoas reconheceram Erik e Wallace como sendo a dupla de assaltantes da Zona Leste.
Somente denúncia não basta
Apesar de os representantes da categoria afirmarem veementemente que a dupla teria cometido os assaltos, o delegado titular do 13º DIP, Einstein Rebouças, explicou que apenas a denúncia não serviria como embasamento para a prisão dos dois. “Eles são pessoas comuns, típicos caboclos amazonenses. Podem ser confundidos facilmente. Além disso, não havia motocicletas, componentes de veículos ou armas que pudessem incriminá-los. Não é a partir daí que se prende uma pessoa, não apenas baseado em denúncias e reconhecimentos. É necessário que haja indícios. Vou ouvir as vítimas, as testemunhas, os rapazes suspeitos e depois vou liberá-los. Não haverá sequer indiciamento”, salientou o delegado.
Os mototaxistas afirmaram que, caso a dupla fosse liberada, não ficaria impune. “Eles fazem parte da mesma quadrilha que aqueles outros dois. Daquela vez, chamaram-nos de assassinos, quando fizemos a nossa própria justiça. Nossa intenção é que a justiça seja feita, de um jeito ou de outro. Já que a polícia não cumpre o seu papel, nós cumpriremos”, disse Ozair. Até o final da tarde de ontem, a dupla não havia sido liberada.
Categoria acusada de matar
No último dia 24 de abril, duas pessoas suspeitas de roubar mototaxistas foram duramente espancadas e baleadas. Alvino da Silva Nascimento, 22, morreu em virtude de pauladas.
De acordo com os funcionários do Instituto Médico Legal, a fúria foi tamanha a ponto de deixá-lo com a face desfigurada. Alvino deu entrada no Pronto-Socorro João Lúcio com um suposto comparsa, identificado como Jessé Feitosa Corrêa, 33. Mototaxistas teriam reconhecido a dupla como assaltantes da categoria. Os dois teriam sido conduzidos até a Alameda Cosme Ferreira, nas proximidades do bairro Colônia Antônio Aleixo, mesma zona. No local, os mototaxistas mataram Alvino a pauladas e utilizaram uma arma de fogo para atirar em Jessé. Ele levou dois tiros no abdome. Os dois foram atendidos pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência e encaminhados ao Pronto-Socorro João Lúcio. Apenas Jessé chegou vivo.